Capítulo XI - Ameaça
O instinto fez Fiolon
despertar: uma presença não convidada estava à espreita, observando-os. O
vulto, que contrastava-se com as aberturas da estrebaria, estava parado: ainda
que tenha vindo lentamente, o barulho da chuva teria encoberto o som de seus
passos. Como não pretendia ser pego de surpresa, Fiolon mentalizou o punhal
preso em seu tornozelo e trouxe o objeto até às suas mãos, na expectativa.
Fechou os olhos quando o velho acendeu um iluminador de gelo, e a luz fraca não
permitiu que visse rosto do inimigo, escondido por um capuz. Fiolon ampliou a
visão mental e pôde ver quando o vulto deu um passo arrastado, elevando o
iluminador para ver melhor o ambiente. Ficou um tempo analisando, até que
pareceu se interessar por Mikayla. Enquanto debruçava-se sobre ela, Fiolon, com
um movimento rápido, apontou seu punhal para o desconhecido:
– Não ouse tocar nela! – disse
baixa e friamente.
O vulto assustou-se e,
atrapalhando-se com as próprias vestes, gritou e caiu, acordando froniais e
Mikayla. Os animais começaram a emitir ruídos estressados enquanto a menina
tentava entender o que se passava. Fiolon passou por cima dela e prendeu seu
inimogo ao chão, com o punhal apertado em sua garganta.
– O que você quer?? - bradou Fiolon.
– P-por favor não me machuque!
– gemeu uma voz choramingosa
Movida pelo senso de
praticidade, Mikayla ateou fogo em uma tocha:
abaixo de Fiolon, um ser gordo, de grandes olhos esbugalhados e muitas
rugas no rosto tremia apavoradamente.
– Porque estava aqui? O que
quer?? – bradou Fiolon, demonstrando uma coragem nunca antes vistas por
Mikayla.
– E-eu não... e-eu só... eu só
queria saber quem estava aqui! Achei que... que fossem as bestas!
– Solte ele Fio!
Fiolon hesitou por alguns
instantes antes de sair de cima de seu oponente e ir para perto de Mikayla,
ainda de punhal em riste. Com um esforço que logo foi perceptível ser da idade
avançada, um velho sentou-se, ainda mantendo os braços na defensiva.
– Por favor não me machuquem!
Podem levar o que quiserem!
– Não queríamos nada além de
abrigo. – respondeu Mikayla.
O velho,
cuja cabeça parecia dominada pelo gelo eterna das montanhas, respirava com
certa dificuldade. Mikayla parecia esperar que ele se recuperasse para
desenvolver um diálogo, mas Fiolon, ainda sob o efeito do despertar repentino,
estava impaciente. Percebendo a confusão e a insegurança que habitavam dentro
dele, Mikayla enviou-lhe ondas de tranquilidade: tanto ele quanto o velho
estavam em um impasse, agindo por defesa.
– Perdoe a
atitude de meu primo Senhor, ele apenas nos defendia.
– Eu
entendo... – foi dizendo o velho, lentamente – No mundo em que vivemos ações
sobrepõem-se á razão.
– O que
pretendia aproximando-se tão sorrateiramente? – quis saber Fiolon, ainda
desconfiado.
O velho
analisou-os por um tempo antes de responder.
– Vocês são
jovens – murmurou o velho, parecendo mais para sai do que para os arquimagos.
Parecia que agora, baixada um pouco a guarda, ele realmente os via – eu pensei
em surpreendê-los antes que pudessem me atacar...
– Achei que
as regras de hospedagem valessem nestas terras também – disse Mikayla, um pouco
assustada com o que não foi dito mas concluído na fala daquele estranho: havia
implicações de medo e perigo a cada respiração dele. – Não vamos incomodá-lo
mais: iremos recolher nossas coisas e partir.
Fiolon
olhou admirado para ela: ainda chovia bastante lá fora, mas Mikayla sabia que
não era só por isso que ele a
indagava com o olhar. Mikayla sempre fora a mais impetuosa e questionadora dos
dois, era de se esperar, no mínimo, muitas perguntas.
– “Não
vamos piorar a situação” – ecoou o pensamento na mente do arquimago.
Ela pegou
as bolsas e juntou suas coisas para partir. Fiolon mantinha o punhal erguido
diante do velho, vigilante, mas vê-lo esfregando o pescoço com mãos decrépitas
somado ao esfriamento da situação fez com que se sentisse culpado por tê-lo
machucado. Afinal o velho só defendia seu lar. Antes de saírem, Fiolon lhe
entregou um emplastro de ervas.
– Use isto
para aliviar a dor, e como recompensa do que quer que tenhamos lhe causado.
O Velho
ainda olhava para o emplastro enquanto eles retiravam os animais. Cobrindo-se
com as capas, os arquimagos saíram para a chuva. Já estavam próximo aos portões
quando gritos roucos os chamaram de volta. .
– Esperem, esperem!
Há muito tempo que não chamam a minha atenção a respeito das velhas regras.
Muita coisa mudou por aqui nos últimos anos, e me fizeram esquecê-las. Eu não
serei conhecido como um mal anfitrião, então por favor fiquem.
O jovem
casal entreolhou-se: precisavam descansar, mas acima de tudo, poderiam confiar?
O Velho,
percebendo a relutância caminhou vacilante até eles, mas o bambear de seu corpo
fez com que escorregasse e caísse: Fiolon socorreu-o
– Ah.. nada
como uma mão amiga! Acho que tivemos uma série de mal-entendidos, rapazinho: eu
sou D. MacAran e será um prazer hospedar vocês em meu lar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário